O aumento da pirataria, a era dos streamings e agora a pandemia forçaram seu fechamento. (Foto: Janailton Falcão)

Sucesso até a primeira metade dos anos 2000, as locadoras podiam ser encontradas em quase todos os bairros de Manaus. Famílias e amigos viveram bons momentos após emprestar filmes desses espaços. No entanto, o aumento da pirataria, a era dos streamings e agora a pandemia forçaram o fechamento do último estabelecimento deste tipo, em Manaus.

No final dos anos 90, os cartazes destacavam sucessos de bilheteria como À Espera de Um Milagre, Gênio Indomável e Titanic. Não havia quem não ouvisse falar nos filmes e sentisse ao menos um pouco de vontade de ir a um cinema para apreciar as obras.

No entanto, as condições financeiras, a distância, ou mesmo a preferência por comodidade nem sempre permitiam ir aos locais onde esses filmes eram exibidos. Por isso, um publico cinéfilo corria para as famosas locadoras.

No bairro Parque Dez de Novembro, Zona Oeste de Manaus, os moradores contavam com a famosa Take Vídeo, uma das locadoras de maior sucesso da época, na cidade. Não havia dia que o local estivesse vazio. Dono do negócio, Overland Cruz lembra com muito carinho daqueles tempos áureos.

“Na nossa ficha de clientes cadastrados, temos 38 mil pessoas. O número ja´ é alto, mas pense agora que a maioria dessas pessoas têm pelo menos um dependente cadastrado, o qual também pode alugar filmes. É muita gente que vinha aqui”, afirma Overland, enquanto se apoia em uma prateleira e passa a mão no cabelo.

Pandemia e os muitos fins

Overland Cruz diz que irá sentir saudade dos momentos que viveu na locadora. (Foto: Waldick Junior)

O sucesso da Take Vídeo foi até o início dos anos 2000. O formato VHS (fita) fazia sucesso e dificultava a pirataria, o que mudou com a chegada dos DVDs. Esses foram, segundo Overland, uma benção acompanhada de maldição.

Embora os DVDs tenham melhorado a qualidade do produto e diminuído o espaço de armazenamento, o novo formato permitiu o aumento da pirataria, o que, ao longo do tempo, levou ao fechamento de inúmeras locadoras em Manaus e em outros cantos do mundo.

No entanto, a era do streaming, segundo Overland, foi a “coice do cavalo”. A nova forma de ver filmes impediu que a locadora fosse dona dos lançamentos logo após a saída no cinema, o que terminou de desestabilizar o mercado.

“Chegamos a alugar mais de 1,4 mil filmes em apenas um sábado. Muitas vezes eu começava a almoçar às 12h e só acabava de comer às 15h, porque precisava parar e atender clientes. O movimento era gigante”, diz o empresário que hoje trabalha no ramo da construção civil.

Parado em frente ao balcão da locadora, ele olha com vislumbre para as prateleiras espalhadas no espaço. Parece buscar algo, uma resposta, ou apenas vive preso às memórias do que viveu ali.

Por volta de 2017, o empresário deixou de receber qualquer lucro por seu trabalho. Até aquele momento, ela já era uma das únicas de Manaus. Apesar disso, Overland manteve o negócio por causa da paixão com o que fazia.

“Continuei esse tempo todo, mas no início da pandemia não deu mais. Como a produção dos filmes ficou estagnada, a distribuidora onde eu comprava os lançamentos deixou de enviar os novos títulos. Então, só com filmes não atuais, deixamos de ser uma locadora e nos tornamos um acervo. E durante essa crise toda, ainda houve clientes que ligaram perguntando sobre novos filmes, mas não os tínhamos”, conta Overland, com um ar de tristeza.

Agora a Take Vídeo irá fechar após mais de 23 anos, embora o dono não saiba o dia exato. O acervo está sendo vendido, e, de vez em quando, um cliente aparece para obter algum título. Enquanto a reportagem conversava com o empresário, um homem entrou na loja e reservou quatro títulos. Apesar disso, a demanda atual já não paga o suficiente para sustentar a locadora.

Para Overland, o que fica é o sentimento de amizade que construiu com inúmeros clientes ao longo desses anos. Diz que sua locadora marcou a vida de muitas famílias, aos fins de semana. “Levamos alegria a todos”, reflete ele. (EM TEMPO)